domingo, 31 de março de 2013

Debate - Poliparentalidades

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O grupo PolyPortugal vai estar, dia 6 de Abril, no debate promovido pelo Clube Safo, sobre Poliparentalidades!

Numa altura em que a família nuclear com pai, mãe e filhos é um ideal que se distancia cada vez mais da realidade e num momento em que tantxs vivem já os seus afectos e laços de formas tão diversas, o Clube Safo propõe uma tarde de conversa sobre poliparentalidades. Queremos falar sobre parentalidades diversas, famílias monoparentais, famílias arco-íris, famílias poly. Este debate vai reflectir sobre as vivências diversas do que é família, sobre as mudanças que se têm vindo a verificar e sobre como pais e filhos vivem novas configurações relacionais. Famílias com duas mães, com dois pais, com vários adultos responsáveis e cuidadores são experiências reais que mostram como as pessoas estão a escolher os seus caminhos muito além da normatividade.
Pretendemos com este debate esclarecer o conceito de poliparentalidades, estendendo-o às famílias LGBTQ e poliamorosas, apontando as alterações legais mais recentes e os acontecimentos que cada vez mais colocam estas questões no espaço público. Mas este não é um debate apenas teórico: pais, mães e filhxs estarão presentes para falar do seu dia-a-dia e das suas vivências familiares.


Com a participação de Fátima Marques, Fabíola Cardoso, Daniel Cardoso e Alistair Grant.

Contamos com a presença de todxs para abrir novos caminhos à diversidade e às famílias que estamos a fazer todos os dias! Link para o evento no Facebook.

domingo, 3 de março de 2013

Aos novos rumos

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Este texto é uma história pessoal sobre activismo. Quem o faz sabe que a maioria de nós nunca leva só uma bandeira. Muitos têm vários bonés ou chapéus, outros vão alternando a bandeira que carregam com orgulho. No meu percurso ainda muito curto de activismo, tenho notado que luto sempre em várias frentes. Sou sócia da UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta), pela costela feminista. Faço parte do grupo PolyPortugal e este parece, ultimamente, ser o meu lado mais visível. Simpatizo com as Panteras Rosa, pela costela queer. Também por esta costela, faço parte do Bizarrias. Sou lésbica e há dois anos que desfilo na Marcha do Orgulho segurando a bandeira da bissexualidade e com um vestido bi. No entanto, este texto não é sobre nenhuma destas afiliações mais ou menos oficiais, mas sobre uma outra. 

No dia 9 de fevereiro deste ano assinei o meu nome nos documentos oficiais, no final de uma Assembleia Geral do Clube Safo. Fundada em 1996, esta é a única associação em Portugal que tem como missão principal defender os direitos das lésbicas. O facto de ser a única diz muito sobre a visibilidade lésbica, assim como disso são testemunhas os anos difíceis que quase viram a sua dissolução. O risco real de desaparecimento da única associação centrada nas mulheres lésbicas foi, felizmente, superado. O convite para integrar a lista chegou no princípio de 2013 e eu aceitei quase de imediato por conhecer a história do Clube.

Fui convidada por alguém em quem tenho uma enorme confiança intelectual e que me disse que o Safo precisava de lésbicas como eu. Não apenas num sentido de renovação, mas também num sentido de alargamento de horizontes. O Safo convidou uma lésbica poliamorosa, numa relação com um homem e queer para ter um papel activo nos grupos de trabalho e nas actividades que vão ser desenvolvidas. Isto, para mim, representou um voto de confiança, mas também um sinal de que as pessoas que estão a trabalhar pelo Clube Safo querem ver mudanças e querem levantar questões importantes para as identidades lésbicas, mas também para a comunidade LGBTQ em geral e outras identidades não-normativas. 

O Clube Safo está com os movimentos feministas, LGBT, anti-austeridade, pró-escolha, de ecossexualidade e sex-positive e contra todas as formas de discriminação de etnia, idade, género ou outras. A riqueza desta proposta é visível, mesmo ainda sem o que vou dizer em seguida. É que o Clube Safo tem, pela primeira vez na sua agenda, o tema do poliamor, das não-monogamias e da poliparentalidade como central para a comunidade LGBT. Temos em Portugal uma única associação de defesa dos direitos de mulheres lésbicas, uma associação que continua a renascer e a refazer-se, levando agora também na mão a bandeira poly, junto com tantas outras. 

E eu não podia estar mais feliz por fazer parte disto e segurar, bem alto, a bandeira do Safo.

Este texto é de teor pessoal e não representa a opinião de cada uma das pessoas que compõe o Clube Safo nem pretende subsumir as opiniões de qualquer uma das sócias. As únicas opiniões aqui veiculadas são as minhas e esta é a minha pequena estória de activismo no Clube Safo.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Hierarquias de compromisso

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Tenho um bocado a mania, sei-o bem, de escrever coisas sobre a reformulação das hierarquias de sentimentos, de crítica à importância que o romantismo tem como expressão máxima de amor, sobre o privilégio associado a 'estar em casal', blá blá blá.

E, para muita gente, tal coisa é densa, abstracta, pouco útil ou pouco prática. De modo que hoje quis mostrar que tudo isto é extremamente prático e, também, extremamente doloroso de se ver/viver.

Já me aconteceu, mais do que uma vez, envolver-me com alguém que não se identifica necessariamente como poliamorosx, ou sequer como não-monogâmicx. Fazê-lo tem sempre o seu quê de tensão, porque há um conjunto de experiências pelas quais eu passo que não encontram eco ou reflexo na experiência dessa pessoa - e isso pode, por vezes, tornar mais difícil a empatia de parte a parte, ou a gestão de situações com mais tensão.

Uma particularidade deste tipo de relação é a de que, caso essa pessoa se interesse por outro alguém, poderá haver a ruptura da relação existente. Noutros casos, uma pessoa que se identifique como não-monogâmica pode mesmo deixar de se identificar como tal, e querer uma relação monogâmica (eventualmente com um terceiro elemento).

Ora, é para mim mais do que óbvio que todas estas coisas são legítimas. Achar que quem entra numa relação enquanto poly, assim tem que ficar até ao fim dos tempos amén é irrealista. As pessoas, sentimentos, vontades e contextos mudam. Para mim, a questão não é, de todo, essa.

Trata-se, antes, da existência de hierarquias de compromisso. Permitam-me explicar: a situação em que uma pessoa mono (numa relação com uma pessoa poly) se vê na possibilidade de iniciar uma outra relação com uma outra pessoa mono (terminando assim a relação com a pessoa poly) não é igual a quando uma relação mono acaba e dá lugar a outra.
Isto porque terminar a relação com a pessoa poly para estar com a pessoa mono é visto, frequentemente (e socialmente), como um regresso ao normal, ao saudável, ao expectável.

Quando a isto se junta, por exemplo, a situação de o envolvimento entre a pessoa poly e mono não ser do tipo romântico (e o das duas pessoas mono potencialmente o ser), desce-se mais um degrau nesta hierarquia. Não só se está a regressar ao normal, como também se está a regressar a uma vivência que vale a pena, é respeitável e que é melhor porque faz mais sentido (afinal de contas, se alguém é monogâmicx, porque iria desperdiçar a sua única relação com algo não-romântico?! /fim de sarcasmo).

Desconfio que isto torna mais fácil 'saltar fora' de uma relação com alguém poly. Pela minha experiência pessoal, isto também torna mais fácil que surjam comportamentos de desrespeito pela pessoa poly, pela relação com essa pessoa, pelos compromissos assumidos - porque essa relação/pessoa está 'naturalmente' mais abaixo numa hierarquia de compromissos. Ao mesmo tempo, espera-se que essa mesma pessoa poly compreenda a naturalidade de ser colocada na prateleira de baixo dessa hierarquia de compromisso, e os comportamentos possivelmente abusivos ou desrespeitosos.

(Nota: embora eu considere que, por questões de discriminação e invisibilidade social, as configurações acima descritas têm dinâmicas e características próprias, no abstracto, que facilitam tais acontecimentos, existem imensas outras situações que não passam por haver um elemento poly. Um exemplo corriqueiro é o típico "Adorava ir sair contigo, mas x namoradx também quer e portanto tenho ir sair com elx". Todas estas situações têm que ver com os elementos 'teóricos' abordados acima: a suposta primazia naturalizada do casal e do amor romântico.)